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quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Risos

Rir faz bem.

Rir é o remédio da alma. Talvez cantar também.

O bom de dar risada é que é uma atividade que não exige muito de nós. Internamente e externamente. Quando você quer sorrir, se divertir e ser feliz, você ri. Simples assim. Para rir não é preciso dinheiro, diploma ou influência, apenas o desejo da alma de sentir-se leve.

Isso não significa que rir seja pouco importante, ou que rir seja mundano, ou que rir deva ser subjulgado a todas às outras atividades consideradas próprias de nossa espécie, porque são mais relevantes ou nos trazem bens. De que adianta trabalhar, se o trabalho é um desgosto? De que adianta estudar, se os ensinamentos se esquecerão, as técnicas não serão aplicadas e as memórias somente servirão para deixar saudade? Qual o bem que viver esta vida que as pessoas acreditam ser a "correta" vai nos trazer? Imóveis, carros, propriedades, televisões, geladeiras, computador e uma quinquilharia de coisas que não representam absolutamente nada e não nos definem enquanto pessoas? Que bem há nisso? São apenas "bens" materiais e nada mais.

Por isso rir é tão bom. O riso é despretensioso. O riso é inocente. O riso é até muitas vezes ingênuo, bobo. Mas assim não somos todos nós, lá no fundo? Onde as sombras da alma escondem nossos maiores medos, dores e aflições? O coração é sempre uma criança, cheia de medo, de espontaneidade, de alegria, de curiosidade, de simplicidade. E todos somos crianças, apesar das roupas que vestimos, dos apelidos que herdamos, das coisas que temos, daquilo que fazemos. Todas as "máscaras" servem exatamente ao seu propósito: manter este jogo, esta peça, que hora é drama, hora é comédia, que é a vida.

Há quem diga que àz vezes é melhor "rir para não chorar". O riso é tão poderoso que quando o coração está aflito, a mente confusa e a alma se sente presa tão forte nas profundezas do desconhecido, que nem o choro consegue libertar, é o riso quem surge para quebrar as correntes que prendem a alma às preocupações terrenas. Será o riso então uma dádiva, um milagre, um ato quase que divino? Possivelmente sim.

O riso não tem contra-indicações, nem efeitos colaterais. E não deixa sequelas. Ou deixa, se considerarmos a felicidade e a plenitude como sequela de qualquer coisa. Existem outras coisas que nos fazem bem, que trazem algum prazer ou satisfação. Amizade, amor, sexo, paixão. Entretanto, todas essas coisas, que são tão fortes, tão intensas, apaixonantes e até, por que não dizer, "viciantes", podem deixar feridas. Feridas que demoram para fechar, feridas que às vezes sentimos, mas não sabemos como curar. Feridas que às vezes nem sentimos, mas sabemos que estão lá, e que em algum momento, virão à tona, machucarão a carne e o espírito. E sabe o que é mais curioso? Às vezes nem o tempo, nem o amor conseguem curar essas feridas? Afinal, como curar com amor, uma ferida de amor? Não estou dizendo que é impossível, mas muito estranho, e muito difícil. A verdade, é que o riso tem um poder tão grande que nem o grandioso tempo e o poderoso amor podem negar.

E o mais curioso, é que o tempo nos faz escravo dele. Somos controlados pelo tempo, pela suas artimanhas, pelo seu pesar, pelo medo que ele impõe. Minutos, horas, dias, semanas, meses, anos. É impossível negar que vivemos marcados e regulados por medidas que sequer existem para a alma. E somos prisioneiros delas. Mas o riso não. O riso pode durar alguns segundos, alguns minutos, ou algumas horas até, mas seu efeito em nós dura muito mais do que seria proporcionalmente coerente, lógico e aceitável. Uns minutos de riso podem mudar sua forma de ver as coisas, de sentir o mundo e então, a forma de viver a vida, de aceitar certas coisas.

Nenhum amor dura apenas alguns minutos ou algumas horas. Amar leva tempo. O amor precisa de tempo. E deixar de amar, é igualmente trabalhoso e tem seu tempo. A paciência é um pré-requisito para o amor. E é fundamental para desfazer um amor também, embora há quem diga que Amor (o sentimento pleno, puro, simples, honesto, divino) não deixa de existir nunca. Pode ser. Mas aqui me referia ao amor, com letra minúscula mesmo. Aquela palavra que serve para definir o sentimento que uma pessoa sente por outra, que envolve outros sentimentos mais mundanos (paixão, atração, afeto). É, o riso é meio impaciente. Ele vem e vai a hora que quer, e deixa seu aviso sem preocupação. Não quer esperar como o amor, mas também não deixa feridas.

Seria melhor rir do que amar então?

Não.

A vida sem Amor, não é vida, é sobrevida (ou melhor seria dizer "sub-vida"?). A vida sem paixão não tem sentido. A vida sem sexo é monótona.

E a vida sem riso? A vida sem riso é monótona e sem sentido, é quase sobrevida. A vida sem riso é infeliz. E ninguém nasceu para ser infeliz.

Todos têm o direito de serem felizes. Todos deveriam ser felizes. Mas eu não posso fazer nada pelos outros.

Por isso eu rio. Às vezes a vida ri da minha cara, e às vezes, quando olho, somente olho as coisas, rio da vida também. E às vezes nós rimos juntos. Pode até ser da cara um do outro, mas se for juntos, não tem problema.

Eu rirei mais.

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